Como criar um sistema de educação para o século 21
Você provavelmente já escutou que, cada vez mais, as habilidades contam mais na carreira de um profissional do que os conhecimentos técnicos ou diplomas. Dentro dos métodos atuais de educação, porém, o conteúdo ainda é rei – basta lembrar das aulas de escolas e universidades. “A educação como conhecemos tem uma metodologia de centenas de anos, e não é boa para a economia de hoje”, diz Taddy Blecher, CEO do Instituto Maharishi, instituto de educação sem fins lucrativos da África do Sul que capacita jovens de baixa renda que não conseguiram acesso a universidades pelo baixo desempenho escolar. Com o trabalho, mais de 18.500 sul-africanos desempregados receberam instrução, encontraram emprego e passaram da pobreza para a classe média, de acordo com dados do instituto.
A experiência, segundo Blecher, pode ser replicada em outros países. A chave é a personalização da educação e uso de tecnologia para identificar as dificuldades de cada aluno. Em entrevista a Época NEGÓCIOS, ele descreve o que ele imagina ser uma educação para o século XXI. Nesta terça-feira (11/06), ele participa do Singularity U Brazil Summit, que acontece em São Paulo.
Você diz que o sistema educacional que temos hoje não funciona para todos. Por quê?
A educação como conhecemos tem uma metodologia de centenas de anos, e não é boa para a economia de hoje. Com a modernização crescente, esse sistema se torna cada vez mais ultrapassado. Quando a educação está atrasada, o resultado é o crescimento da desigualdade, e é exatamente o que vemos em países como Brasil e África do Sul. Algumas pessoas têm acesso à educação moderna e desenvolvem mais habilidades do século XXI – e têm mais chances de sucesso. A maioria da sociedade, contudo, vai para escolas comuns e antiquadas: 50 estudantes com livros didáticos, um professor de pé na frente da lousa e provas que cobram conteúdo decorado. Isso não desenvolve as pessoas para a economia moderna. Precisamos reinventar nossos sistemas educacionais e torná-los holísticos. Empresas em todo o mundo – Brasil, África do Sul, Reino Unido, Estados Unidos, Canadá – observam escassez de talentos. Em todos os países há desempregados que poderiam ocupar essas vagas, mas há uma crise de talentos porque essas pessoas não têm as habilidades necessárias. É preciso modernizar a educação, para prepará-la para a quarta revolução industrial.
E como fazer isso, na prática? Quais são os pilares para a educação no século XXI?
Primeiro, precisamos de uma personalização em massa para adaptar a aprendizagem para que cada indivíduo possa caminhar no seu ritmo, com base em seus interesses. Duas pessoas podem ter dificuldade em matemática, mas o problema para uma não é o mesmo que a outra. Quando você tem um professor a cada 50 pessoas, ele só fala de verdade com duas ou três, para os outros a aula está muito rápida ou devagar. A tecnologia ajuda a lidar com esse problema: pode descobrir qual conhecimento está faltando para cada estudante. Além disso, acho que a educação vai mudar o foco do conteúdo para habilidades. O conteúdo vale muito é de graça e está na internet. As empresas vão contratar mais pelas competências e habilidades do que pelo conhecimento.
Quais habilidades precisam ser ensinadas?
São competências e soft skills, como criatividade, solução de problemas complexos, negociação, habilidade para trabalhar em equipe, inteligência emocional, empatia e liderança. Não é suficiente mudar o foco do conteúdo para habilidades, as pessoas precisam desenvolver as competências para o século XXI. A mais importante é o que chamamos de meta aprendizado, ou meta cognição, que é como uma autoconsciência sobre como você aprende. Só assim é possível estar continuamente aprendendo ao longo de toda a sua vida.
Com essas habilidades, é possível lidar com a crise de talentos?
Mesmo isso ainda não é suficiente, precisamos de maestria: que é quando um ser humano é capaz de integrar todos os tipos de conhecimento em qualquer contexto. Todos os estudantes deveriam chegar a esse ponto. Quando você consegue um diploma, deveria ser um mestre da vida, não apenas ter conhecimento sobre um pequeno campo. Esse deveria ser o objetivo da educação. Em 2045, a inteligência artificial vai ser muito mais inteligente do que um ser humano. Como competir? É preciso ter essa maestria, pessoas mais criativas, capazes de lidar e se adaptar a novas condições. O sistema atual é completamente desatualizado e não consegue fazer isso.
O conhecimento não é suficiente, as habilidades não são suficientes, meta cognição não é suficiente. Em uma educação ideal, estaríamos desenvolvendo todas essas dimensões do ser humano. E há muita gente preocupada com isso: os governos estão em pânico, como fazer com que seres humanos se mantenham relevantes? Mas há uma tensão no sistema educacional em todo o mundo, porque há pessoas falando disso e da quarta revolução industrial e da educação para o século XXI, mas há sistemas, como no Brasil, que incentivam que uma parte grande dos alunos passe de ano. Tirar uma nota boa e passar de ano não significa que a pessoa seja empregável. Sem mudar isso, cada vez mais essas instituições estarão despreparadas para a economia moderna, e haverá um incompatibilidade cada vez maior entre o que a economia precisa e o que o sistema educacional produz.
Fonte: Daniela Frabasile – Época Negócios
Data: 11/06/2019