Educação híbrida funciona nos EUA, mas no Brasil é uma promessa

Publicado por Sinepe/PR em

Em vez de estarmos avançando no currículo e recuperando parte da aprendizagem comprometida no ano passado, ainda estamos discutindo questões básicas para reabertura das escolas

A educação foi profundamente atingida pela Covid-19: milhões e milhões de crianças, adolescentes e adultos de todo o mundo tiveram as aulas interrompidas e passaram a estudar de forma remota, numa conjuntura bastante desafiadora. Segundo estudos do Banco Mundial, a pandemia aumentou a desigualdade de aprendizado e pode ter levado a uma redução global de cerca de 16 pontos na escala de proficiência média do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), o teste da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Isso equivale a cerca de meio ano escolar de aprendizagem. Pesquisas feitas por estudiosos norte-americanos constataram que houve redução do conhecimento adquirido por estudantes norte-americanos durante a pandemia em comparação com o conhecimento desses alunos em um ano escolar regular, sem interferência da pandemia.

O vírus Sars-CoV-2 provocou uma grande perda para a educação brasileira e mundial, que começou com a implantação do ensino remoto. No entanto, com a introdução do modelo híbrido, em que alunos passaram a ter aulas presenciais e aulas remotas, aos poucos o cenário foi mudando. Segundo o Departamento Educacional dos Estados Unidos, a educação híbrida vem se mostrando mais efetiva do que a educação 100% presencial ou a educação 100% não presencial. Isso se dá, principalmente, pela mudança do papel do aluno que, de sujeito passivo, passa a ser sujeito ativo. Um dos modelos de educação híbrida mais bem sucedidos é aquele que combina as atividades dos professores e dos alunos na escola, com transmissão das aulas com professores ao vivo e aulas gravadas, com indicações de vídeos, textos, músicas ou outros recursos e o desenvolvimento de projetos por parte dos alunos, inclusive de forma cooperada com outros colegas por meio e com o auxílio das novas tecnologias de comunicação.

Essa mudança vai ao encontro de estudos realizados pelo pesquisador Scott Freeman e um grupo de colegas, professores da Universidade de Washington, que revelaram que as abordagens de ensino que transformam os alunos em participantes ativos, ao invés de serem apenas ouvintes, reduzem consideravelmente as taxas de reprovação, pois a aprendizagem é mais efetiva. No Brasil, porém, a história é diferente. Enquanto, como vimos, nos Estados Unidos já começam a aparecer os primeiros resultados da educação híbrida, mostrando-se mais eficaz que a educação presencial, por aqui ainda estamos no discurso de que é possível implantar uma educação híbrida, considerando parte das atividades na escola e parte em casa.

Estamos chegando ao final do primeiro semestre do ano letivo de 2021 e a grande maioria dos municípios e escolas, principalmente as da rede pública de ensino, ainda mantém o ensino remoto e, o que é ainda pior, sem os recursos básicos nem as condições para garantir a mínima qualidade e a segurança necessária para o retorno às aulas presenciais. Assim, em vez de estarmos avançando no currículo e recuperando parte da aprendizagem comprometida no ano passado, ainda estamos discutindo questões básicas para reabertura das escolas. Essas questões passam pelas condições de higiene e segurança para as crianças, indo até fatores estruturais, principalmente em relação à tecnologia e à internet. Muitas instituições, inclusive as de educação superior, estão adiando a volta das aulas por saberem que não há estrutura de conexão suficiente para todos os professores trabalharem simultaneamente conectados em suas aulas, ou seja, o que funcionou e o pouco que funcionou até agora foi devido a recursos particulares de cada professor. Mesmo que a educação híbrida já esteja sendo debatida e prevista desde o mês de julho de 2020, poucas escolas ou sistemas se mobilizaram para preparar as instituições para esse tipo de educação com o mínimo de qualidade. E ainda continuamos contando com a internet particular dos professores, assim como com os seus aparelhos e instrumentos tecnológicos de uso pessoal.

O que estamos esperando? O que precisa realmente acontecer para que os gestores, dirigentes e políticos invistam de fato nas estruturas necessárias para que essa nova modalidade de educação ocorra? Quanto tempo ainda vamos levar nessa discussão? Em outro artigo, que publiquei aqui mesmo, apresentei algumas questões extremamente relevantes e urgentes, que devem ser levadas em conta, de “cabo a rabo”, para implantarmos uma educação compatível com o momento que vivemos no Brasil e no mundo, assim como com a nova sociedade que nasce a partir da crise que estamos vivendo. Fala-se de uma competição global e de preparar o aluno para as demandas e desafios de um mundo globalizado e internacionalizado, mas muito mais como discurso do que como uma realidade, principalmente para as crianças menos favorecidas. No entanto, a pandemia tem nos mostrado – e vai mostrar ainda mais – que as fronteiras físicas foram todas derrubadas: uma pessoa não precisa mais ir a São Paulo para trabalhar em uma empresa paulistana; Nova Iorque, Londres, Pequim ou Estados Unidos,
Europa, Ásia estão logo aí, no clicar de dedos. As oportunidades serão inúmeras, mas a pergunta que não quer calar é: para quem?

Será que os milhares de alunos que estão sem aula desde março do ano passado ou outros milhares que estão tendo aulas apenas por textos enviados para as suas casas a cada semana ou quinze dias ou outros milhares de estudantes para quem o WhatsApp foi o máximo de tecnologia utilizada nas aulas terão alguma chance nessa competição? Será que eles terão o mínimo de conhecimento para tentar se imaginar em uma dessas novas situações? As respostas não precisam ser escritas aqui, pois estão escancaradas em todos os lugares, mas omitidas por aqueles que realmente têm em mãos o poder e as condições para mudar o jogo. Acho que já fomos longe demais ao desconsiderarmos a educação em tempos de pandemia. Já não há mais o que escrever nem o que falar. Mas há muito a fazer.

Por: Jovem Pan