Brasil precisa colocar 5 milhões de alunos de volta na escola, diz Unicef
Para instituição, pandemia faz país recuar 20 anos no acesso ao ensino de estudantes com até 17 anos
No Brasil, por causa da pandemia, cerca de 5 milhões de crianças e adolescentes estão fora da escola, segundo estudo do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), fazendo com que o país volte 20 anos no acesso ao ensino de estudantes com até 17 anos. Exclusão digital e a demora na reabertura das escolas estão por trás desse número.
“Esses 5 milhões nos levam duas décadas para trás. É o número de crianças e adolescentes que estavam fora da escola naquela época”, afirmou Florence Bauer, representante do Unicef no Brasil, durante Live do Valor.
O trabalho do Unicef foi feito com base em dados da última Pnad Covid, pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em novembro do ano passado.
Para Bauer, além da reabertura urgente das escolas, com os protocolos de segurança necessários, é fundamental fazer uma busca ativa das crianças e adolescentes que abandonaram os estudos. O Brasil, diz, é o país em que mais tempo as escolas ficaram fechadas na pandemia.
“Quem abandona a escola são os mais vulneráveis e que se tornarão ainda mais vulneráveis no futuro. Corremos o risco de perder essas crianças por que é muito difícil que voltem para a escola [sem ajuda]”, afirma.
Cerca de 42% desses 5 milhões que estão sem acesso ao ensino são crianças de seis a dez anos, fase em que o acesso à escola era quase universal antes da pandemia. É uma fase de alfabetização, de aprender a aprender, e uma lacuna aqui cria uma grande barreira para o retorno da criança aos bancos escolares, afirma Bauer. Segundo ela, o Unicef está ajudando municípios na busca ativa de crianças e adolescentes em mais de 3 mil municípios no país.
Júlia Ribeiro, que atua desde 2007 como Oficial de Educação no Unicef no Brasil, comenta que, embora a Pnad Covid não tenha dados sobre crianças de quatro a cinco anos, já se percebe um contingente maior de meninos e meninas sem acesso à educação também nessa faixa etária.
“É um momento fundamental. Diversas experiências pelo mundo mostram que é preciso resgatar o vínculo com escola”, afirmou.
Antes, até que haja uma reabertura total dos estabelecimentos de ensino, é preciso levar infraestrutura para essas crianças e adolescentes, já que muitas ficaram sem acesso aos estudos por causa da falta de internet e equipamentos, como computadores e smartphones.
Ambas as representantes do Unicef afirmam que houve um esforço das redes de ensino para ofertar atividades educativas de forma remota, mas a pesquisa mais recente, de março deste ano, da União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) mostra que infraestrutura e acesso à internet ainda é um gargalo. Cerca de 90% ofereceram atividades por meio de material impresso e WhatsApp.
Para Florence Bauer, houve muitos esforços, mas o impacto da falta de acesso à escola em crianças e adolescentes tem sido maior do que se previa.
“O fechamento das escolas tem impacto profundo na aprendizagem e em outros aspectos do desenvolvimento da criança. Mais da metade delas não teve acesso à merenda escolar. Há a violência doméstica, que na maioria das vezes ocorre dentro de casa. A criança perdeu a proteção da escola”, diz.
“Por isso, ficamos muito preocupados com um fechamento tão longo.”
Para Bauer, dado o aspecto cíclico da pandemia no país, é normal haver um abre e fecha dos estabelecimentos, mas é importante priorizar a volta à aulas. E para além da reabertura das escolas, Bauer chama atenção para a necessidade de alcançar os jovens com iniciativas de emprego e educação.
Junto com alguns parceiros, o Unicef desenvolveu um programa chamado “Um milhão de oportunidade”, que tem como meta dar acesso à educação de qualidade, fomentar o empreendedorismo e dar acesso ao mercado de trabalho em estágios, programas de aprendizagem, como o menor aprendiz, e emprego formal.
“Convidamos o setor privado a dar oportunidade à população mais vulnerável. Precisamos de que toda a sociedade ajude para apoiar essa geração de jovens, que é a maior da história. Não é um slogan, mas uma meta real para dois anos”, afirma Bauer. Lançado no fim do ano passado, o programa tem atualmente cerca de 80 parceiros, sendo 50 deles empresas.
Por: Valor Econômico