Diálogo contínuo com as famílias é fundamental para gestão escolar resolver conflitos
Portas abertas para receber responsáveis e canais de comunicação ativos para consultas e retornos são pontos-chave para fortalecer a liderança – e o dia a dia – da escola
A liderança dos diretores escolares é o segundo fator que mais influencia a melhoria da educação – está atrás, somente, da atuação dos professores em sala de aula. A afirmação é reforçada pelo estudo “Liderança escolar: diretores como fatores-chave para a transformação da educação no Brasil”, recém-lançado pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).
“Reconhecemos o papel da boa liderança escolar como uma poderosa força capaz de transformar a qualidade de educação e de influenciar de maneira positiva o trabalho coletivo que se realiza diariamente na educação básica”, afirmou Marlova Jovchelovitch Noleto, diretora da Unesco no Brasil, durante a apresentação online da publicação. “Mais do que nunca, precisamos de mentes críticas para tempos que também são críticos”, disse.
Com os recentes ataques às escolas e os boatos com ameaças de violência que circulam pela internet, o momento é, de fato, bastante delicado para a gestão escolar, acredita Danielle S. Martins de Toledo, supervisora pedagógica da Escola Liessin, no Rio de Janeiro (RJ). “A exposição às redes sociais e às novas tecnologias alteraram a sociedade. Nossos alunos estão mais expostos, a facilidade de acesso a grupos radicais e extremistas foi ampliada”. Além de pensar em soluções para a segurança digital, parar de minimizar as questões socioemocionais da sala de aula também é papel do líder escolar, diz a supervisora. “Ensinar frações não pode ser prioridade para entender o motivo do seu aluno chorar depois de uma prova de matemática. Dar uma advertência de atraso não pode estar acima de compreender a origem da causa e educar o aluno”, exemplifica.
Um caminho possível para estreitar os laços é ampliar a parceria com as famílias, pontua Danielle. “Familiares não são rivais da escola. Ao contrário: ambos os grupos estão buscando o mesmo objetivo, o melhor para o aluno. Vamos conversar mais com as famílias. Vamos ampliar as visões rígidas e conflituosas que afastam famílias e alunos dos professores e da escola”, sugere Danielle, inspirada no modelo de administração coletiva da Liessin. A escola, com quase 78 anos de atuação, conta com um Diretório de Pais, grupo eleito a cada dois anos para colaborar com a gestão escolar.
O modelo se assemelha ao PTA (Parent Teacher Association, Associação de Pais e Professores, em tradução livre), comum em países como Índia e Inglaterra. Cada turma escolhe um responsável como representante. Periodicamente, os voluntários reúnem coordenação e direção escolar, a fim de colaborar nos processos gerais de comunicação e gestão.
Ética da comunidade escolar
Envolver as famílias e a comunidade em processos colaborativos com a direção, a fim de fortalecer a aprendizagem dos estudantes, também é um ponto apresentado pelo estudo da Unesco. Para tanto, escreve a pesquisadora canadense Katina Pollock, da Universidade de Ontário Ocidental (Canadá), a comunicação do gestor deve ser efetiva, respeitosa e de confiança.
“Quando os líderes se esforçam para conhecer e entender outros indivíduos e culturas, são capazes de rever suas pré-suposições sobre os estudantes, suas famílias e suas comunidades”, afirma. “Ao priorizar a comunicação efetiva em suas escolas, os líderes são capazes de resolver conflitos à medida que surgem.”
Com base na ideia de que a educação é um processo comum que envolve líderes, estudantes, famílias e educadores, ela se refere à “ética da comunidade”. “Os líderes educacionais desempenham um papel importante nesse processo porque se reportam às comunidades e não às perspectivas individuais. As habilidades associadas à ética da comunidade incluem: esforçar-se para conhecer e entender os outros; engajar-se no diálogo contínuo; e criar fóruns que permitam ouvir todas as vozes.”
Convite à convivência
No Colégio Edim, localizado na Vila Ede, em São Paulo (SP), Daphiny Monteiro Barbosa Becker divide a direção com a mãe, e o ambiente familiar transparece no dia a dia da instituição. “Somos carinhosas, amorosas, muito abertas ao diálogo. Isso cria um ambiente de harmonia e tranquilidade. Quando há cordialidade e respeito, o gestor se coloca em uma posição de que todos estão ali com o mesmo propósito. Assim, criamos um senso de ajuda mútua com a comunidade escolar”, diz.
A escola costuma reunir os funcionários de diferentes áreas para diferentes encontros. “Além da parte pedagógica, costumamos fazer encontros entre uma pessoa da equipe de limpeza, alguém da administração e um professor, por exemplo. Isso funciona muito bem”, comenta Daphiny.
Com as famílias não é diferente: o diálogo também é contínuo. Afinal, a escola tem de ser um lugar de conforto e de segurança, pontua a diretora. “Os pais querem se sentir seguros, e é preciso demonstrar essa segurança. As portas da direção e da coordenação ficam sempre abertas”, comenta.
A escola conta, ainda, com um portal digital do aluno. O canal pode ser acessado via site ou aplicativo, e reúne as principais informações sobre os estudantes, como as atividades em sala de aula, frequência e funções administrativas, como acesso aos boletos. Por lá, também há espaço para a comunicação com as famílias.
Por mais espaços de troca
Celinha Coelho, coordenadora pedagógica da Aderj (Associação dos Diretores de Escolas Públicas do Estado do Rio de Janeiro) e gestora do CE Pandiá Calógeras em São Gonçalo (RJ), reforça que o diálogo é o princípio norteador da educação. “Escola e família estão interligadas desde a Constituição Federal, que mostra a educação como direito de todos e dever do Estado e da família”. Por isso, diz ela, a escola deve promover encontros e espaços de troca além das reuniões de pais.
“Muitos pais não têm tempo de ir às reuniões, por questões de trabalho. Costumamos pedir aos estudantes que façam atividades em conjunto com as famílias, e postamos os vídeos em nossas redes sociais. Essa parceria é fundamental, ainda mais em um momento como o atual. Não é fácil manter a atualização, mas temos notado que essa troca tem sido bastante efetiva”, comenta. “A tecnologia garante um contato mais estreito com as famílias, nos ajuda muito na dinâmica da comunicação com os pais, até para o caso de precisarmos de uma conversa pessoal – afinal nada substitui o contato humano. Mas é preciso entender os limites, até onde podemos ir com a tecnologia”, diz.
Outro ponto destacado por Celinha é o autocuidado que gestores, educadores, estudantes e familiares precisam ter. Nesse sentido, o diretor pode tomar atitudes simples, mas eficazes: desde convidar psicólogos para palestras até fazer rodas de conversa periódicas para compreender os problemas da sala de aula. “Normalmente, na correria, deixamos para conversar depois. Isso tem sido invertido aqui na escola: conversamos antes de o professor ir para a sala. Tanto com professores quanto com alunos, nunca deixamos o papo para depois, para que ninguém entre na aula sob estresse”, diz a diretora. A cada bimestre, a gestão também pede retorno avaliativo dos professores e da equipe para entender as dificuldades e o que pode ser melhorado. E o diálogo tem surtido efeito: não há casos recentes de violência na escola.
Dicas para aproximar família e gestão escolar
• Estabeleça um calendário de reuniões antes do início do ano letivo, para que os responsáveis fiquem cientes com antecedência;
• Realize eventos educativos, como festa junina, caminhada com animais de estimação e noite cultural, por exemplo;
• Planeje a pauta dos encontros com os pais junto aos professores;
• Exponha trabalhos dos alunos em datas comemorativas;
• Organize eventos esportivos;
• Promova ciclos de debates e convide os responsáveis a sugerir os temas;
• Mantenha as redes sociais atualizadas e ativas;
• Adote um software de gestão escolar: além de facilitar o dia a dia e a organização da administração, um aplicativo ou um site customizado favorece a comunicação.
Por: Por Vir