Inclusão: por que e como construir o Plano Educacional Individualizado (PEI)
Documento reúne as necessidades, conhecimentos e potencialidades dos estudantes com deficiência
Aprovada em 2008, a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva não só garante a matrícula dos alunos com deficiência, Transtorno do Espectro Autista (TEA) ou altas habilidades nas escolas regulares do Brasil, como também prevê o atendimento às suas necessidades educacionais especiais de forma integrada à proposta pedagógica da escola.
Para auxiliar a garantir esse direito, temos o Plano Educacional Individualizado, mais conhecido pela sigla PEI, um documento elaborado pelo professor com base na observação e avaliação de um aluno com deficiência, TEA ou altas habilidades. O instrumento reúne as necessidades, conhecimentos prévios, potencialidades e habilidades destes estudantes, além de detectar as barreiras que enfrentam para seu bem-viver na escola.
É importante ressaltar que não se trata de um laudo, mas de uma ferramenta de planejamento, apoio e acompanhamento pedagógico do desenvolvimento do estudante. “Antes de tudo, o PEI é um direito desses alunos de terem seus educadores debruçados sobre eles, procurando a melhor forma de ensiná-los. O PEI é um documento escolar e não médico”, destaca Maria da Paz (Gunga) Castro, educadora, formadora de professores e especialista em inclusão.
O PEI é especialmente valioso para orientar a parceria entre o trabalho do professor do Atendimento Educacional Especializado (AEE) e da sala de aula regular.
O documento conta a história desse estudante – o que e como ele estudou, como isso foi avaliado, entre outros pontos – ele garante que a trajetória do aluno não se perca, independentemente da rede ou escola em que se matricule. “Isso é especialmente útil quando o aluno vem de outra turma ou de outra unidade escolar. Enquanto para outras crianças o principal documento de comunicação entre docentes é um boletim, relatório, portfólio, essas crianças precisam de mais. O PEI é um arcabouço da vida estudantil da criança com deficiêcia”, acrescenta Gunga.
Apesar de elaborado pelo profissional do AEE, o instrumento não deve ser uma incumbência só dele – o planejamento, discussão e aplicação são coletivos. “O PEI deve ser construído perpassando todos os setores da escola, envolvendo desde o profissional da Sala de Recursos até a gestão”, explica Andreia Castro de Andrade, professora de AEE na EMEIF Benedita Torres, em Canaã dos Carajás (PA).
Quando e o que considerar para construí-lo?
Dentro do calendário escolar, o PEI de cada aluno deve começar a ser escrito ainda no início do ano letivo e não há uma data de conclusão. Ele deve fazer parte da rotina escolar e ser revisto constantemente, para fazer alterações quando necessário, conforme o andamento do ano e desenvolvimento do estudante.
“Costumo dizer que PEI se faz a lápis, nunca a caneta. Eu desconfio de um PEI que esteja pronto em março. A escola tem que ter autonomia para construir seu documento de avaliação que pode se basear em atividades, observação, provas, etc. A partir dessa avaliação, ela traça então objetivos e metas para cada aluno com deficiência. É importante que coloque também, neste momento, as ações dos professores que supõem que vão contribuir para a meta”, aconselha Gunga.
Em linhas gerais, o PEI deve, primeiramente, justificar o porquê daquele aluno necessitar do documento e responder às seguintes questões: o que, como, para que, e por que ele vai aprender aquele determinado conteúdo.
Como construí-lo?
O primeiro passo para a construção do PEI é a realização de um diagnóstico. Conhecer a fundo o estudante e seu entorno, mapear suas potências e as barreiras para sua aprendizagem é o que possibilitará a elaboração de um documento robusto que ajude, de fato, a planejar estratégias e propostas contextualizadas. Este momento é especialmente importante para que a criança não seja reduzida ao seu laudo médico.
Adriana Cunha, professora de AEE na EM Professor Ricardo Gama, em Recife (PE), lembra que o PEI deve colher informações sobre o aluno a partir de conversas com professores, famílias e com a própria criança. “Cada criança vai ter seu PEI que responda às suas necessidades. Ele deve apontar quais são as intervenções que a gente pode trabalhar com ela”, diz a educadora. “Se é uma criança com dificuldade de concentração, o PEI deve contribuir para que essa dificuldade diminua. A gente deve pegar essas orientações e transformar em um percurso educacional, com objetivos e habilidades que precisam ser trabalhadas e quais são os recursos possíveis para isso.”
Na rede em que Andreia trabalha o PEI possui outro nome, Plano de Desenvolvimento Individualizado (PDI), mas sua função é a mesma: auxiliar as ações pedagógicas de aprendizagem do aluno com deficiência que recebe o AEE na Sala de Recursos Multifuncionais (SRM), de modo a garantir um ambiente inclusivo, de acordo com o currículo desenvolvido pela escola.
“Na hora de construí-lo, o primeiro contato é com a família. Pesquisamos com ela todas as informações daquele aluno. O histórico da criança começa ainda na gravidez, passa pela primeira infância, o primeiro balbucio, o desenvolvimento motor, até chegar naquele momento atual”, conta a educadora. Também pergunta-se sobre o laudo médico, a medicação que utiliza, o lugar onde a criança vive, sua vida social, seus interesses, suas dificuldades, entre outros pontos.
Esta conversa feita pelo professor de AEE é encaminhada para o setor de orientação da escola para gerar um relatório circunstanciado que será compartilhado com a coordenação pedagógica. Esta última, por sua vez, convida cada professor da escola para uma conversa individualizada que dá insumos para o planejamento das diferentes aulas. “O professor de Ciências, por exemplo, pode vir a conhecer que a criança gosta muito de um jogo ou desenho e decidir usá-lo para ensinar um conteúdo”, explica Andreia.
O elo entre sala comum e a sala de recursos é feito por meio de reuniões. “O professor entra com o pedagógico, o conteúdo, e a gente entra com a adaptação do pedagógico”, explica.
A rede de Canaã dos Carajás possui também um instrumento avaliativo que é anexado ao PDI e aplicado a cada bimestre. “Cada vez que a gente realiza uma avaliação, a gente preenche esse documento, uma espécie de relatório que descreve como foi o decorrer do bimestre para o estudante. Ele teve êxito nas atividades? Teve retorno positivo? O que pode mudar? O que pode melhorar? Então, no próximo bimestre, isso serve como base para revisar o PDI”, explica a educadora.
PEI em constante revisão
Como um documento vivo, sua avaliação deve ser contínua. “É importante que as avaliações sejam rotineiras, baseadas em uma observação cuidadosa e detalhada”, afirma Gunga. “O PEI não vai ser avaliado só no final do ano, mas o tempo todo para ver o que ele já atingiu e o que ainda falta. Na nossa escola, a gente tem acesso ao PEI online no site da prefeitura e vamos preenchendo e editando por lá, acrescenta Adriana.
A professora acrescenta ainda que tanto professor da sala comum como o professor de AEE devem enxergá-lo como um instrumento formativo. “Ali, estão, por exemplo, práticas que já deram certo, práticas que eles podem se inspirar para fazer em sua sala, é um feedback interessante para o docente”.
Esta percepção de que o documento existe para o auxílio de toda a comunidade escolar é o que não pode ser perdido de vista. “Quando cheguei na rede, eu não conhecia o instrumento e achei que era mais uma burocracia. Não tinha noção da grandeza desse instrumento, do quanto ele podia proporcionar para a escola, para mim e para o aluno”, pontua Andreia.
Por: Nova Escola