Ser pai ou ser mãe: nenhuma missão é mais desafiadora, mais nobre
Educar um filho ou filha é a tarefa mais nobre – e uma das mais difíceis – que o Bom Deus concedeu à espécie humana. Em meio a tantas vicissitudes do mundo contemporâneo, com incertezas, volatilidades e ambiguidades, ser pai ou mãe é estar sempre se equilibrando na gangorra da vida, com muitas alegrias e desafios. Como nenhum rebento vem com manual de instruções, educar é conviver com erros e acertos, uma missão da qual não se tem “o direito de se aposentar”.
Paradoxalmente, as palavras são menos efetivas ao transmitir valores, pois mais eloquentes e eficazes são os exemplos. Educamos muito pelo “como somos”, pouco pelos “cromossomos”: nosso patrimônio cognitivo, moral e espiritual precisa ser replicado e transmitido de geração para geração. E nesse mister, algumas tarefas são essenciais para um bom legado nessa divina missão.
A primeira delas é preparar para a vida adulta, ou seja, é dar gradativamente autonomia para a criança resolver as situações adversas que enfrenta. A psicóloga Maria Estela E. Amaral Santos é enfática sobre a superproteção: “possivelmente será um adulto inseguro, indeciso, dependente, que sempre necessitará de alguém para apoiá-lo nas decisões, nas escolhas, já que a ele foi podado o direito de agir sozinho”. O caminho da evolução pessoal não é florido, tampouco pavimentado. Ao contrário, permeado de pedras e obstáculos, que são as adversidades, as frustrações, as desilusões. Da superação das dificuldades advêm alegrias e destarte aprimora-se a autoconfiança para novos embates. Há momentos em que os pais devem ser dispensáveis, e para tanto aos descendentes “devemos dar raízes e dar asas”.
É importante transmitir aos pequenos valores interpessoais e um projeto de vida. Ética, cidadania, solidariedade, respeito ao meio ambiente, autoestima são fundamentais para que se tornem adultos flexíveis e versáteis, aptos a trabalhar em equipe e resolver problemas, bem como abertos ao diálogo, às mudanças e às novas tecnologias.
Um dos maiores desafios, em especial nos dias atuais, é equilibrar afeto e limites. A autoridade, quando exercida com equilíbrio, é uma manifestação de afeto e traz segurança. “O comportamento frouxo não faz com que a criança ame mais os pais. Ao contrário, ela os amará menos, porque começará a perceber que eles não lhe deram estrutura, se sentirá menos segura, menos protegida para a vida. Quando os pais deixam de punir convenientemente os filhos, muitas vezes, pensam que estão sendo liberais. Mas, a única coisa que eles estão sendo é irresponsáveis” – palavras muito pertinentes de Marilda Lipp, renomada psicóloga e professora paulista, autora de dezenas de livros.
Em se tratando de educação formal, pequenas divergências entre a escola e a família são aceitáveis e, quiçá, salutares. Nossos filhos e filhas precisam desenvolver a tolerância, a ponderação, preparando-se para uma vida na qual os conflitos serão inevitáveis. No entanto, na essência, deve haver entendimento entre pais e educadores. O educando é como um pássaro que dá os primeiros voos. Família e escola são como suas duas asas: se não tiverem a mesma cadência, não haverá uma boa direção de voo.
É preciso falar da segurança do amor paterno e materno, considerando que importa mais a qualidade do afeto do que a quantidade de tempo disponível à criança. No entanto, é preciso nutri-la afetivamente, pois a presença negligente é danosa para o relacionamento. É uma missão e um dever dos quais não se pode furtar. Amiúde, não raramente filhos veem-se órfãos de pais vivos. A vida profissional, apesar de suas elevadas exigências, pode muito bem ser ajustada a uma vida particular equilibrada. Dediquemos ao nosso maior tesouro a mesma urbanidade e atenção com que tratamos nossos amigos e colegas de trabalho, imprimindo um pouco de nós, pelo diálogo franco e adequado à idade.
Educar integralmente uma criança é também prover a ela uma trilha para a espiritualização: manter a fé no Deus Criador, a Inteligência Infinita. Estimular a força das preces, das boas energias e do pensamento positivo, que promovem curas e nos confortam nas horas de sofrimento. Em conjunto, praticar a solidariedade voluntária e sincera. Sobre isso, Madre Tereza de Calcutá tem autoridade para nos ensinar: “as mãos que ajudam são mais sagradas que os lábios que rezam”. São gestos que levam dignidade e autoestima, e o retorno é o prazer de ser útil, além de ser uma terapia edificante. Belas e oportunas são as palavras de Dalai Lama: “A ajuda aos semelhantes nos traz sorte, amigos e alegria. Sem ajuda aos semelhantes acabaremos imensamente solitários”.
Para muitos pais e mães pode não parecer, mas é uma imprevidência prover todas as vontades (brinquedos, roupas, passeios, conforto etc.) da criança. Até quando vão perdurar essas facilidades? Muitas vezes, priorizamos aquilo que não tivemos em nossa infância, mas cabe a pergunta: estamos lhe dando aquilo que efetivamente tivemos e que nos proporcionou momentos felizes?
É nosso papel, além de tudo, conceder tempo para que sejam crianças ou adolescentes, isto é, não se deve sobrecarregá-los com agenda de executivo: esportes, línguas, música, excesso de lições etc. Ademais, é mister limitar o tempo diante da sedução e da passividade das telas. Se queimarmos etapas de seu desenvolvimento, serão adultos desprovidos de equilíbrio emocional. A infância precisa ser uma etapa de brincar, de partilhar e de conviver com os amigos, desenvolvendo-se assim a sociabilização, as faculdades psicomotoras e outras soft skills indispensáveis.
Criar bons hábitos alimentares e exercícios físicos é um dos principais legados a ser deixado. A saúde presente e futura da criança será diretamente proporcional à frequência e à regularidade da prática de esportes e da ingestão de proteínas, frutas, verduras, legumes e bastante água, somado à importante exposição ao sol, nos horários recomendados. Tais hábitos promovem o bem-estar, a autoestima e a boa disposição para a vida.
E, por fim, delegar tarefas no lar, mesmo que haja resistência, pois é importante que a criança tenha – proporcionalmente à sua idade – responsabilidades em casa, assumindo algumas tarefas como limpar o tênis, lavar louça, tirar ou colocar a mesa, ajudar nas compras e no seu acondicionamento, cuidados com o pet etc., além dos indispensáveis hábitos de higiene e organização de seu quarto.
Jacir J. Venturi foi professor e diretor de escolas públicas e privadas, professor e coordenador da UFPR, da PUCPR, da Universidade Positivo. Cidadão Honorário de Curitiba. Autor de livros e pai de 3 filhos e avô de 3 netos.
Por Gazeta do Povo