Com pandemia, letramento digital vira um passo para a pedagogia do futuro
Professores da educação básica ao ensino superior precisam ser preparados durante sua formação para usar interatividade da internet, recursos audiovisuais e modelos híbridos com aulas mediadas pela tecnologia
Nativo ou imigrante? A questão tipicamente associada a relação de uma pessoa com uma região também é aplicada à condição de alguém no mundo virtual. Enquanto muitas crianças, adolescentes e jovens são acostumados a lidar com apetrechos hi-tech desde o berço, não são poucos os membros de gerações anteriores que ainda precisam de manuais de instruções para lidar com o mundo digital.
E o que fazer quando são os professores que, para lidar com as gerações conectadas, precisam de um verdadeiro letramento digital? Se esse vácuo existia, a pandemia o deixou mais evidente e impõe a urgência em preparar os docentes – da educação básica ao ensino superior – com abordagens sobre o que significa a sociedade em rede, modelos híbridos de ensino, tecnologias educacionais e domínio de recursos audiovisuais para a educação presencial ou remota.
As nomenclaturas podem parecer complexas, mas a prática mostra que macetes facilitam muito essa imigração ao mundo digital, explica Caio Augusto Carvalho Alves, coordenador dos cursos de Licenciatura do Senac EAD. A primeira lição pode ser traduzida pelo provérbio clássico: “em Roma, faça como os romanos”. “O nativo digital não tem medo de fuçar, de errar. Ele mexe em um computador, celular, vai abrindo os aplicativos para ver o que acontece. Essa predisposição é uma das habilidades que trabalhamos em nossos cursos”, compara.
Na graduação em Pedagogia, os alunos são estimulados a desenvolverem projetos em sintonia com a realidade dos estudantes do ensino básico atual, como blogs, lives e outras atividades nas quais a interatividade dê a tônica. Entre as disciplinas há algumas específicas sobre os desafios digitais, como educação mediada pelas tecnologias da informação e comunicação, ação educacional mediada e, com um escopo mais amplo, mas centrado no universo digital, uma disciplina sobre empreendedorismo, inovação e economia criativa.
“O nativo digital não tem medo de fuçar, de errar. Ele mexe em um computador, celular, vai abrindo os aplicativos para ver o que acontece. Essa predisposição é uma das habilidades que trabalhamos em nossos cursos”, Caio Augusto Carvalho Alves, Coordenador dos cursos de licenciatura do Senac EAD.
Na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), o curso de Pedagogia atualiza periodicamente o projeto pedagógico. A matriz repaginada em 2020 busca atender mais à necessidade de formação para atuar num contexto digital. Um destaque é a ampliação das práticas de ensino a distância no escopo das unidades temáticas interdisciplinares. O foco se dá em temas como preparo de conteúdos para ensino remoto, híbrido e tecnologias como a automatização robótica na educação.
No início, os graduandos têm contato com a unidade temática Tecnologia Digital da Informação e da Comunicação na prática Pedagógica. Nela, são discutidos os fundamentos de tecnologias para as práticas docentes da educação básica, explorando metodologias ativas, atividades em projetos.
Posteriormente, no quinto período, há uma versão mais avançada da unidade temática, denominada Tecnologia Digital da Informação e da Comunicação: comunidades de aprendizagem. Consiste em quatro horas/aula por semana em que a formação de um pedagogo alinhado ao mundo digital é aprofundada, com a elaboração de propostas de ensino a distância com base em experiências vividas nos estágios supervisionados.
“Um grupo desenvolveu um curso de 20 horas para ajudar os funcionários de uma escola particular na qual atuavam a utilizarem os recursos de seus celulares para se familiarizarem com as tecnologias”, explica Maria Otilia José Montessanti Mathias, professora da Faculdade de Educação da PUC-SP. “Outra equipe fez uma formação EAD para pais de alunos com dificuldade em acompanhar as lições de casa dos filhos. São exemplos de transformação da realidade, papel dos educadores.”
Tal qual uma mudança física de país e língua, imigrar ao mundo digital é reconhecer que a fala pode ter para sempre um leve sotaque. Mas é estar aberto ao aprendizado com os nativos e garantir que esse acento não prejudique a comunicação.
“Não somos (os professores) ‘donos do saber’, mas aprendizes, sempre. Devemos valorizar o que os nativos digitais trazem, não só como ferramentas da inserção na cultura digital, mas como experiência de vida, mobilizando-os para o prazer de aprender e compartilhar o aprendizado”, resume Marília Josefina Marino, coordenadora do curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da PUC-SP.
Devemos valorizar o que os nativos digitais trazem, não só como ferramentas da cultura digital, mas como experiência de vida, mobilizando-os para o prazer de aprender e compartilhar o aprendizado
Marília Josefina Marino, Coordenadora do curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da PUC-SP
Por Estadão