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Educação especial começa pela valorização do professor

Se quisermos avançar, precisamos encarar a educação inclusiva como prioridade nacional. Isso significa, principalmente, dar ao professor o protagonismo que ele merece

A educação é a base de todas as transformações sociais, especialmente sob o aspecto da inclusão. É nela que moldamos cidadãos, construímos oportunidades e definimos o futuro de um país. No entanto, quando olhamos para a realidade brasileira, vemos uma contradição dolorosa: temos uma das legislações mais avançadas do mundo em defesa das pessoas com deficiência, mas ainda estamos distantes de garantir o direito à educação inclusiva de forma efetiva.

Levantamento do Instituto Rodrigo Mendes, com dados do Censo Escolar realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), escancara esse abismo: se o Brasil mantiver o ritmo atual de formação de professores para educação especial, levaríamos 468 anos para preparar todos os profissionais da rede. Isso significa que, na prática, uma geração inteira de crianças e jovens continuará sem o apoio adequado dentro da sala de aula.

Nos últimos 10 anos, o número de alunos com deficiência mais que dobrou. Hoje, são mais de 2 milhões de matrículas em escolas regulares. Porém, o contingente de docentes formados na área passou de apenas 4,4% para 6,4% no mesmo período. É um crescimento pífio diante da urgência. A proporção de professor para aluno, que já era baixa, piorou: em 2014, havia um docente especializado para cada nove estudantes da educação especial; agora temos apenas um para cada 13.

Essa baixa formação de professores — tanto para a educação básica quanto para a especial — não é fruto do acaso. É consequência direta da desvalorização histórica da profissão docente no Brasil. Salários baixos, falta de infraestrutura mínima, sobrecarga de horas/aula, turmas superlotadas, ausência de capacitação continuada e uma rotina marcada pela exaustão afastam talentos e desestimulam os jovens a seguirem a carreira. Assim, formamos menos professores, e os que se formam, muitas vezes, não recebem a preparação adequada.

É nesse cenário que tenho lutado por uma educação capaz de formar cidadãos conscientes, participativos e preparados para a vida. Por uma educação de inclusão real, que não deixa ninguém para trás e que garante ao aluno com deficiência o direito de aprender e se desenvolver com dignidade. E por uma educação que valorize o professor.

Não é aceitável que a mais nobre das profissões continue recebendo salários aviltantes, sem condições adequadas de trabalho. Por isso, defendi e sigo defendendo que o professor da educação básica pública tenha reajuste salarial sempre que houver aumento dos vencimentos dos parlamentares federais. Se os representantes do povo podem ter seus salários corrigidos, muito mais justo é que aqueles que formam o futuro da nação também sejam valorizados.

Mas a valorização vai além do salário. É preciso garantir condições para que o professor tenha prazer em ensinar e ferramentas para desempenhar seu papel. Um docente bem preparado e respeitado transforma não só o destino de um aluno, mas de toda uma comunidade. Em uma sala de aula inclusiva, ele é o elo entre a criança com deficiência e a sociedade, entre o conhecimento e a autonomia, entre a esperança e a realização.

Sigo firme também na defesa da formação obrigatória dos educadores para o atendimento de alunos com autismo e outras deficiências. Porque inclusão não é apenas colocar todos na mesma sala de aula; inclusão é garantir que cada aluno tenha a oportunidade real de aprender, com professores preparados, motivados e respeitados.

Formação inicial consistente, capacitação continuada, equipes multidisciplinares, salas de recursos multifuncionais, melhores condições de trabalho e remuneração justa — esses são os pilares de uma educação inclusiva que funcione de verdade. Mas ainda há um desafio cultural: reconhecer que a inclusão não é um favor, mas um direito constitucional. Ela está na Lei Brasileira de Inclusão, na Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, ratificada pelo Brasil, e em tratados internacionais que reforçam a necessidade de garantirmos igualdade de oportunidades.

Se quisermos avançar, precisamos encarar a educação inclusiva como prioridade nacional. Isso significa alocar recursos, planejar políticas públicas efetivas, incentivar parcerias com universidades, apoiar famílias e, principalmente, dar ao professor o protagonismo que ele merece. Não há inclusão sem o olhar atento de quem ensina. Não há transformação social sem o respeito a quem dedica a vida à sala de aula.

É preciso lembrar: o professor é quem transforma a lei em prática, a igualdade em realidade e a esperança em futuro. É ele que dá voz e oportunidade às pessoas com deficiência, garantindo que cada aluno tenha não apenas uma vaga na escola, mas condições reais de aprender e se desenvolver.

Se o Brasil quer uma educação plena, cidadã e, acima de tudo, inclusiva, precisa valorizar o professor. Não podemos esperar séculos para reconhecer isso. O tempo da inclusão é agora, e ele só será verdadeiro se vier de mãos dadas com a valorização de quem ensina.

Por: Correio Braziliense

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